segunda-feira, 13 de junho de 2011

Monopólio masculino não é vontade de Deus

Para a teóloga Doris Strahm, o monopólio masculino na Igreja Católica Romana é uma simples questão de poder.

 

É o que afirma em entrevista exclusiva à swissinfo.ch. Ela é coautora de um estudo sobre a mulher em cargos de liderança no Judaísmo, Cristianismo e Islamismo.

Talvez todos sejam iguais perante Deus, mas existem determinadas comunidades religiosas que não consideram isso. É o que mostra o estudo "Rabinas, cantoras, imames, pastoras, bispas, conselheiras eclesiásticas...", publicado pela Usina Inter-religiosa de Ideias, um grupo institucional independente de expoentes do diálogo inter-religioso.

O estudo levou em consideração três correntes religiosas no Judaísmo, na Igreja Reformada e na Igreja Católica Romana e no Islamismo na Suíça. Assim como nas comunidades judaicas liberais e nas comunidades protestantes, as mulheres podem assumir postos de liderança espiritual.

swissinfo.ch: O estudo mostra que na Igreja Católica Romana trabalham muitas mulheres, porém elas não estão autorizadas a assumir postos de liderança espiritual. Por que o padre na Igreja Católica precisa ser necessariamente um homem? 

 

Doris Strahm: A Igreja Católica argumenta que Jesus convocou apenas homens para serem apóstolos e também pela tradição católica. Esse é um argumento sem bases, pois Jesus era judeu e nunca fundou uma igreja. O sacerdócio só surgiu no século cinco.

Mesmo a Comissão Papal Bíblica concluiu em 1976, ao ser levantada essa questão, que a exclusão de mulheres do sacerdócio não pode ser fundamentada na Bíblia.

Até os anos 1980, se argumentava que as mulheres não podiam ser ordenadas padres devido o caráter sacramental do sacerdócio: os padres representariam em suas funções religiosas Cristo, que era um homem. Portanto padres necessitariam ser do sexo masculino.

swissinfo.ch: Existem outros critérios além do sexo? 

 

D.S.: Não existe nenhum outro critério especial além do sexo. Padres recebem a mesma formação teológica do que as teólogas.

Em minha opinião, a importância do sexo masculina está relacionada à formação patriarcal da nossa cultura e, especialmente, à teologia cristã: figurações masculinas de Deus como Pai, Senhor, Criador, Juiz e um Salvador masculino.

O homem se transformou no padrão da condição humana e retrato de Deus e a mulher, do ponto de vista da criação, subordinada ao homem. Tudo isso cimenta a visão de que o homem está mais próximo de Deus do que a mulher. Os chefes da Igreja, que detém o poder da palavra, ainda parecem estar convencidos disso. Ocorre aqui simplesmente uma questão de poder.

swissinfo.ch: Qual a imagem da mulher que está por trás disso? 

 

D.S.: Por trás da discriminação da mulher na Igreja Católica romana está a compreensão patriarcal do culto da pureza original da mulher, uma imagem do poder feminino da sedução sexual e a opinião que a mulher, frente aos olhos de Deus, tem menos importância do que o homem. São crenças que a Igreja ainda não superou.

swissinfo.ch: Como é possível que duas igrejas, cuja doutrina tem as mesmas bases, tenham considerações absolutamente distintas na questão da ordenação de mulheres como padres? 

 

D.S.: Isso mostra que não existe uma base bíblica e teológica para excluir as mulheres do sacerdócio. São exatamente as mesmas fontes em que se baseiam os protestantes. É a mesma tradição e é o mesmo Salvador.

swissinfo.ch: Em seu estudo (página 38) pode se ler: a pessoa que ordena uma mulher comete, segundo as leis eclesiásticas, um crime tão grave como o do Padre que abusa de menores de idade. Como é possível justificar esse julgamento de valores? 

 

D.S.: A única explicação reside no poder que exerce a Santa Igreja Católica de domínio masculino, para a qual nada é mais sagrado do que preserva o sacerdócio nas mãos dos homens. Eu considero que essa comparação, além de ser cínica, é uma bofetada dupla no rosto.

swissinfo.ch: Nas comunidades católicas trabalham muitas mulheres. Nessas funções elas teriam alguma possibilidade de influenciar as estruturas internas da Igreja? 

 

D.S.: Elas não têm nenhuma forma de influenciar as estruturas da Igreja, pois estão excluídas do sacerdócio. E o sacerdócio é uma exigência para ascender a todos os cargos com poder de direção, decisão e doutrinação.

swissinfo.ch: Como a senhora avalia o Catolicismo em comparação a outras religiões incluídas no seu estudo? 

 

D.S.: O sacerdócio reservado exclusivamente aos homens é uma particularidade da Igreja Católica Romana. Da mesma maneira que a hierarquia eclesiástica se atribui o direito exclusivo de definir os que estão distante do poder, alegando a vontade divina. Eles se defendem quando simplesmente afirmam "que Jesus assim o quis".

Em outras religiões, pelo menos, não justificam a exclusão das mulheres dos cargos de direção com a áurea divina.

swissinfo.ch: Em seu estudo fala-se de uma igreja feminina, que seria criada paralelamente às estruturas patriarcais e hierárquicas. Como é possível entender isso? 

 

D.S.: Desde os anos 1980 as mulheres deixaram de gastar energia na luta contra as estruturas, e se contram em suas aspirações religiosas. Elas reivindicam a Igreja para si também. É um movimento supra confessional mundial de mulheres críticas.

swissinfo.ch: A senhora vê uma chance em que a Igreja Católica Romana evlua mais em direção à igualdade de sexos? 

 

D.S.: De cima, dentro dos círculos oficiais da Igreja Católica, não vejo essa evolução. Se algo deve mudar, isso precisa ocorrer nas bases. As bases religiosas devem ter coragem para procurar o seu próprio caminho e quebrar o centralismo de Roma.

Eveline Kobler, swissinfo.ch
Adaptação: Alexander Thoele

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